Katana
De
todas as armas produzidas pelo homem, nenhuma supera a espada japonesa
quando são analisados critérios artísticos, espirituais e práticos. Suas
rivais européias de Toledo e Damasco não possuem todas suas virtudes,
apesar de terem sido confeccionadas pelos melhores mestres existentes no
Ocidente.
No Japão medieval existiram muitos tipos
de armas. No início do século XI até o final do século XVI com as
batalhas realizadas entre exércitos de senhores feudais rivais, o
principal armamento era o utilizado em campo aberto (lanças, flechas,
naguinatas, etc.). Após a unificação do Japão por Tokugawa Ieyasu
(início do século XVII) as batalhas campais acabaram e começou o período
de duelos entre Samurais, neste momento a espada foi a arma mais usada,
tamanha importância foi dada a ela que ocorreram dois fatos importantes
em sua história: em 1588 o mais poderoso senhor feudal do Japão,
Toyotomi Hideyoshi declara que somente os Samurais podiam portá-la,
assim ele subtraiu-a do alcance dos comuns, reservando-a como privilégio
único e exclusivo da classe guerreira, já a frase mais famosa
relacionada a ela veio do Shogun Tokugawa Ieyasu, que disse: "- A espada
é a alma do Samurai".
A
manufatura da espada japonesa, não era um simples ato de fabricar um
objeto para uma batalha ou utilização específica, o mestre-espadeiro
colocava seu espírito em todas as fases de sua fabricação, chegando ao
ponto de abster-se de sexo, bebidas, carne e da presença das pessoas
comuns durante todo o processo. Seu ateliê era um santuário sagrado, o
aço dobrado sobre si próprio em operações de forjamento sucessivo, o
sentimento colocado em cada martelada, nas imersões na água, nas
passadas na pedra de afiar, era um ato religioso que conferia um
espírito à sua lâmina e a deixava viva com a energia de seu criador.
Existe uma história que é relacionada ao espírito do artesão que era
colocado nas fibras do aço: O mais famoso armeiro japonês foi Massamuné,
conhecido pelo seu espírito bom, sempre que podia ajudava as pessoas de
seu vilarejo, via suas obras como um objeto artístico e instrumento
para a busca da paz, seu melhor discípulo foi Muramasa, que apesar de
aprender toda a técnica da arte possuía um espírito ruim, devido a isso
foi excluído. Conta-se que ao colocar duas espadas, uma de Massamuné e
outra de Muramasa em um regato, quando folhas são jogadas na água, elas
são atraídas para a lâmina da segunda e repelidas pela da primeira, isto
é relacionado pelos estudiosos ao sentimento ruim que Muramasa colocava
em suas lâminas.
A simbologia existente na katana é
que a bainha representa o corpo físico, templo protetor, enquanto a
lâmina, o espírito poderoso que quando utilizado com sabedoria realiza
atos incríveis. Em mãos hábeis de um perito a espada japonesa pode
cortar qualquer parte do corpo humano, um cano de metralhadora , ou uma
folha de árvore caindo ao solo.
Em um tratado
escrito no século XVIII sobre a arte da esgrima (Tengu-geijutsu-ron),
que relatava principalmente os aspectos espirituais da arte, existe a
orientação que o praticante deve conhecer tanto o lado técnico como o
espiritual, e que a busca dos valores mais nobres deve ser feita
procurando-se os sentimentos que brotam do fundo do coração. Quem
pratica a arte das espadas deve corresponder, espontaneamente, à uma
eventual situação, sem se irritar de modo algum por qualquer intenção
externa. A reação deve ocorrer de imediato, como o espelho reflete a
imagem. Através de inúmeros textos, principalmente Zen-Budistas, a
consciência dos praticantes foi sendo moldada e a utilização do katana
mudou de um fim quase sempre trágico de um duelo, para uma reflexão mais
espiritual e certamente benéfica para a sociedade.
Com
a mudança de alguns conceitos, principalmente relacionados a finalidade
da prática da espada, mestres da esgrima começaram a colocar em suas
escolas a importância da busca espiritual, não como meio próprio de
iluminação, mas como um caminho da melhoria de vida de todas as pessoas.
Nesta época surge a fase mais bonita da simbologia relacionada à
katana, ela existiria para dar a vida e não para tirá-la, com o treino
os alunos estariam buscando o que de melhor possuem, e assim poderiam
contribuir melhor para seu aprendizado como pessoas que vivem em
sociedade. Surge o Kendô (O caminho da espada) e as diversas artes
marciais relacionadas à sua prática.
Infelizmente
devido à alguns, a espada japonesa teve sua nobre simbologia denegrida
pela sua utilização na Segunda Grande Guerra, quando oficiais japoneses
decapitavam prisioneiros americanos ou britânicos, que eram amarrados e
colocados de cócoras. Mesmo estas espadas não serem katanas autênticas,
seus donos achavam que estavam praticando a arte dos Samurais, agindo
cegamente por ignorância ou crueldade, eles esqueciam que pelo espírito
do Bushidô (Código de Honra Samurai), um adversário devia ser enfrentado
de frente, e pela frase do Shogun Tokugawa Ieyasu: "o inimigo deve ser
enfrentado à distância da espada, de frente e com respeito". Esta fase
terrível é lembrada com tristeza pelos praticantes e conhecedores da
arte da esgrima, mas não sujou o espírito existente que foi moldado por
séculos de tradição, uma mostra disto é a crescente busca de informações
sobre sua história e técnica existente hoje no Ocidente.
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